quarta-feira, julho 01, 2009

as coisas do vovô

Para que meu pai e sua família se mudassem para a casa da minha avó, uma limpeza no antigo quarto das ferramentas do meu avô teve de ser feita. Ele morreu quando eu tinha doze anos e desde então nada ali havia sido sequer tocado. Em uma manhã ensolarada e fresca, eu e minha tia adentramos o quarto escuro, carregando sacos de lixo, caixas para separar os objetos e máscaras para proteger nossos narizes da predominante poeira.
Foram horas e muitos pregos, roscas, parafusos, objetos não-identificados de plático, borracha e silicone. Fechaduras, maçanetas, molas, bolinhas de chumbo, lâmpadas, lampadazinhas, agulhas, seringas, fios de metal, cobre, naylon e fibra. "Tia, isso é uma peça de alto-falante?", "Não, querida, é uma boca de fogão", termômetros quebrados, bússolas funcionando, antenas de rádio, placas de televisão, martelos, marretas, roldanas, pedaços de corda, grades de ferro, pistolas de cola.
Meu avô sempre comprava vários pacotes de uma mesma peça, para quando precisasse. Quando ele precisava, esquecia onde tinha guardado e comprava mais dez. Assim, podíamos doar para as engenharias da unb os projetos finais de pelo menos seis gerações dos cursos.
Encontramos uma curiosa grande caixa de metal, que quando aberta revelou em seus conteúdo inúmeras chaves. De todos os tamanhos e formatos, enferrujadas, limpas e brilhantes, com capinhas amarelas, vermelhas, azuis e sem propósito algum. Não abrem um ármario sequer da casa. Um mistério que se foi com ele 9 anos atrás.
Abridores de gaveta, torneiras de banheiro, tampas de garrafa, um saco de moedas da época do cruzado, descansos de toalha, lixas, mini-ferraduras, chaves-de-fenda, abridores de lata, saca-rolhas, tarrachas, maletas de ferramentas, mini-maletas com mini-ferramentinhas, pedaços de madeira, afiadores de faca, potinhos de vidro com outros potinhos de vidro dentro, uma mini-garrafa de wisky, canetas tinteiro, tinteiros vazios, lentes, câmeras vazias, potinhos de filme, botões de costura, de controles remoto, de aspiradores de pó.
Pilhas separadas, "bicho-lixo" foi a sucata denominada por minha tia para ser transformada em arte. Fiquei com um chapéu de couro velho que só eu acho bonito, um chaveiro do Peru com o desenho de uma lhama, abotoaduras de prata com ilustração em relevo de um trem, um pente de osso de bode, um pedaço de chumbo usado para pescar e uma das chaves sem propósito virou um lindo pingente no meu pescoço.




Em memória de Glauco Benevolo de Benevolo (filho de primos)

1928 - 2000

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1 Comentários:

Blogger Rafael Cinza disse...

Velho, meu vô é nesse esquema, apesar de o achar pior ainda. Ele guarda lixos sem serventia alguma, já o seu guardava coisas interessantes e, quem sabe, utilizáveis... Meu vô tinha um sótão - não sei se tem até hoje - que tinha as coisas mais nojentas possíveis, sem falar nos insetos escrotos que habitavam aquele lugar... Velho Zé Bezerra...

6:50 PM, agosto 28, 2009  

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